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A Cozinha Emocional, Claro!

Já por duas ou três vezes tinha falado à Ana acerca de irmos ao Claro! mas esbarrava sempre com o que parecia ser um certo desinteresse por parte dela. Parecia-me estranha esta indiferença pois o Claro! parecia um restaurante interessante, a experimentar. Quando o dia de anos da Ana se aproximava e ela deixou escapar que o restaurante onde me levaria para cumprir a nossa tradição bi-anual era fora da cidade, percebi que a sua indiferença era na realidade uma tentativa de não destruir a surpresa de irmos lá no seu dia de anos.

A Cozinha Emocional, Claro! - reservarecomendada.blogspot.pt

Integrado no Hotel Solar Palmeiras em Paço de Arcos o Restaurante Claro! está feito à imagem do seu chef Vítor Claro que depois de passar pelo Vila Joya, pelo Savoy em Londres e no El Racó de Can Fabes, abriu O Pica no Chão. Após esta experiência passou pelo Hotel Albatroz, pelo Degusto e pela Herdade da Malhadinha.


A Ana fez a reserva para o menu da estação que sem aviso prévio só costuma estar disponível ao jantar mas que sendo solicitado previamente pode ser servido também aos almoços. Alias este é um restaurante em que vale a pena tentar ir ao almoço, sem presas, para poder apreciar a vista da esplanada ou da sala virada para o jardim e para o mar. Apesar do sol, estava um pouco de vento e acabamos por preferir ficar na sala.


Ao contrário do que é habitual noutros lugares é prática no Claro! não explicar os pratos quando são servidos deixando o cliente tentar descobrir o que está a comer para somente no final explicar o prato.



Começamos com dois pratos servidos simultaneamente em género de amuse-buche. Se num era bastante óbvio do que se tratava no outro nem tanto... O Salmão Fumado era guarnecido com uma mostarda caseira e o salmão é ligeiramente fumado no próprio restaurante. Simples e agradável. Mas a provocação vinha no outro prato... Logo à primeira vista percebi o que seria. Eu sabia que a Ana não gosta mesmo nada disto, pelo menos na sua apresentação tradicional, mas fechei-me em copas para perceber se ela identificava o que era e se gostava. Só quando comeu a segunda fatia é que percebeu o que era e gostou do Toucinho Bísaro que vinha fatiado tão fino que era transparente, temperado com sal, pimenta e hortelã. A hortelã dava-lhe uma frescura bem interessante e improvável. Um prato bastante simples mas muito bem conseguido e que vai buscar um produto do nosso imaginário mas que atualmente é muito pouco usado a solo. Com risco também, pois se Ana conseguiu gostar deste prato apesar da sua aversão ao toucinho, outros poderão não conseguir ultrapassar este facto.


Neste prato apresentava-se um raviolo em que em vez de massa era usada uma fina película de camarão recheada com cogumelos. Um prato muito bem conseguido e pleno de sabor que funciona como homenagem a um dos mentores de Vitor Claro sendo uma réplica de um prato do malogrado Santi Santimaria, o Raviolo de Gambas e Cogumelos. Foi um dos pontos altos da refeição. Mas era também a ocasião para experimentar aquela que parece ser outra das imagens de marca de Vitor Claro: os pratos a dois tempos. Sobre os restos de azeite e cebolinho deste prato foi vertido um caldo para dar lugar ao Caldo Oriental de Gambas.


O caldo seria resultante da cozedura dos camarões usados no raviolo ao qual se juntava um pouco de alho francês e coentros. Lembrou-me vagamente o caldo da açorda alentejana... Mas poderá ter sido a minha mente a pregar-me partidas...


Esta versão do Bacalhau à Conde Guarda revelou-se bastante fresca e ligeira. Aparentemente simples. O prato original é um prato de forno que habitualmente é acompanhado por uma salada de tomate e daí o serviço de uma quenelle com o bacalhau e uma quenelle com polpa de tomate temperada. A escolha desta forma parece também ser evocativa do pastel de bacalhau. Infelizmente nunca provei o prato original para por lado a lado as duas memórias.


Seguiu-se o Filete de Carapau com Molho à Espanhola. O carapau no ponto e evocativo de memórias gastronômicas. As ovas de truta davam-lhe um pouco mais de cor, textura e salgado. Não há muito a dizer... Simples mas perto da perfeição.


Pescada... Ervilhas... A pescada no ponto. Acho que nunca tinha comido uma pescada tão bem cozinhada. Mas não sou um grande fã nem de pescada nem de ervilhas e apesar de não ter desgostado do prato as minhas memorias pregaram-me uma partida e não consegui reconciliar-me com os ingredientes do prato. E assim a Pescada Fresca do Anzol com Ervilhas e (acho) Molho de Caldeirada não passava para mim de pescada com ervilhas e pus-me na borda do prato.


Mais um prato de uma aparente simplicidade mas que evocava na perfeição o cozido à portuguesa sob a forma da Entremeada de Porco Tostada, Caldo Leve do Cozido. Aqui já não me deixei ficar à margem.


O Vítor Claro é apologista de uma tradição antiga de utilização de saladas como limpa-palato antes da sobremesa, e assim chegou-nos à mesa a Salada Waldorf que cumpriu adequadamente essa função.


A refeição terminou em grande com o Pudin de Água que me trouxe à memória o Pudim Abade de Priscos embora não tenha a certeza da afiliação de um com o outro.


Juntamente com o café ainda foram servidos estes nougats também a piscar o olho a outras memórias.

Todo o menu foi competentemente acompanhado por um menu de degustação de vinhos, que o chef também têm uma costela de enófila, mas não vou falar de vinho que isto já vai longo e ainda tenho umas coisas para dizer.

Demorei umas semanas a começar a escrever este artigo e só passado algum tempo é percebi por onde é que este me levaria. O título surgiu inicialmente como uma provocação. Aquele que será um dos mentores de Vítor Claro, Santi Santimaria, era um fervoroso opositor das técnicas de cozinha molecular criadas por Ferran Adrià tendo este cunhado o termo de Cozinha Tecno-Emocional para definir a sua cozinha. Se o Vítor Claro fosse tão radical quando Santi Santimaria não sei se ficaria nas suas boas graças com esta brincadeira mas parece-me que não o será. O que é certo é que o termo cozinha emocional assenta como uma luva na cozinha de Vítor Claro. A técnica está lá sempre mas o prato chega-nos à mesa a mostrar um quase total despojamento técnico. Por outro lado o cliente é quase sempre convidado a temperar o prato com as suas próprias memórias e emoções sendo estas um dos ingredientes principais na maioria dos pratos. Correm-se riscos, pois se na maioria dos casos as emoções dão um valor acrescentado aos pratos por vezes estas não nos deixam apreciar certos pratos e acabamos por nos deixar ficar na borda do prato. E é quase como se faltasse tempero ao prato... Mas vale bem a pena servir de tempero nos pratos do Vitor Claro.

Portugal - O Melhor Peixe do Mundo - www.wook.pt

2 comentários:

  1. Belíssimo Post! Belíssimo Post! Belíssimo post!
    Rui, és, um blogger emocional. Sabe tão bem ler relatos emocionais,…..
    Se mudares de rumo, deixo de te ler! ; )
    De facto o Vitor é o Chef anti herói, não é? Um gajo que tem uma presença do caraças, mas que se apresenta sempre com aquele ar semi maldisposto, mas sempre disposto a conversar. Uma verdadeira dicotomia indefinida e com uma aura de mistério que se estende aos pratos.
    Sorte a tua que, evidentemente percebes mais de culinária que eu, se não ainda lhe andavas a mandar mails a perguntar o que comeste (aos quais ele não responde! : ))))
    Não me vou, sem antes afirmar que o VC é, dos poucos chef em PT que SABE DE VINHO, MESMO! e que entende, na perfeição o conceito de harmonização!
    Mais uma vez, parabéns pelo post. Não vejo como poderia ser melhor!
    Abraço
    HM

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    Respostas
    1. Obrigado Hugo!

      Comer e beber é um ato emocional e é sobre isso que eu gosto de escrever.

      Um abraço

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