A primeira vez que ouvi falar da Taberna Ó Balcão foi durante a Gala dos Vinhos do Tejo quando recebeu o prémio de revelação da 5ª edição do Tejo Gourmet. A sala ficou eufórica com o anúncio e um clamor de vitória ecoou pela sala. Ena! Trouxeram claque. - pensei alto. Na mesa quem conhecia a casa garantia-me o merecimento deste prémio. Mais tarde em conversa com Rodrigo Castelo dizia-me ele que imediatamente antes deste anúncio a desilusão se tinha apoderado da equipa pois já tendo sido anunciadas as medalhas de prata e ouro e todos os outros prémios com a excepção do melhor restaurante, parecia-lhes de uma extrema injustiça a não obtenção de qualquer distinção.
Passado cerca de um mês proporcionou-se o oportunidade de conhecer in loco a Taberna Ó Balcão que apresentava a nova carta. O espaço explora uma tendência em voga de utilização de elementos decorativos vintage e retro a explorar o kitsch e o saudosismo que há dentro de todos nós. Aqui a aposta resulta elegantemente kitsch ao não se deixar cair em exageros barrocos. Não se cai no excesso de usar pratos desirmanados ou copos menos próprios para o serviço de vinho em nome do um espírito vintage saloio notando-se um grande cuidado com a aparelhagem da mesa. À mesa o kitsch fica-se e bem pelos cestos de pão e pelos individuais feitos a partir de páginas de jornais e revistas dos anos 60 ou 70. O passado forcado do Rodrigo está discretamente presente sem se tornar central como é habitual noutras casa do Ribatejo. Fizemos um viagem pela carta ao longo de 2 entradas, 7 pratos e 4 sobremesas em porções de degustação que permitiram uma boa visão sobre aquela que é a identidade desta taberna.
Fomos muito bem recebidos com os Croquetes de Toiro com Mostarda e pelos Passarinhos Fritos com Malagueta Doce. Já sentados passamos ao Coelho de Escabeche a mostrar-se bem interessante com uma ligação bem conseguida com a maça desidratada que para o meu gosto pessoal só pecava por uma ligeira doçura talvez a pedir um pouco mais de vinagre. Passámos à Sopa de Peixe do Rio com Ovas que mostrava uma interpretação muito bem conseguida de um prato clássico muito popular no Ribatejo e até um pouco mais acima na Beira Interior. Como único pecado senti falta de alguma intensidade de sabor (sal ou talvez um pouco mais de picante) embora provavelmente assim os pratos sejam bem mais consensuais. Passámos pelo Torricado de Bacalhau também numa bem conseguida interpretação de um clássico Ribatejano para entrarmos no auge da refeição com os Lombos de Fataça com Arroz de Berbigão. A Fataça é uma das espécies da família das Tainhas que se dá no rio Tejo e por isso é popular nas zonas ribeirinhas do Tejo. Vinha o lombo da fataça com um fritura perfeita e um arroz de berbigão ao melhor nível que tenho provado (e ainda no dia anterior tinha provado um extraordinário).
O prato seguinte manteve o nível insinuando-se pelo cheiro que trazia a fazer lembrar a sopa do cozido numa brilhante interpretação da Sopa de Ossos. Continuámos com a Lombeta de Novilho com Mostarda matizada e Trilogia de Batata-doce a proporcionar uma ligação muito interessante entre a carne e mostarda bem acompanhada pelas coloridas e saborosas batatas-doces. Terminamos a fase salgada da refeição com o Ensopado de Borrego à Ribatejana com Manjericão e Tomate Fresco que estava muito autentico de sabor. Confesso que altura achei que tomate fresco destoava um pouco do resto do prato. Uma pesquisa à posteriori revelou-me que ao contrario do que estou habituado pelas minha raízes alentejanas, no Ribatejo o ensopado de borrego leva tomate. Isto deixou-me na dúvida se quem destoava seria o tomate ou se seria eu... Para sobremesa tivemos uma trilogia de sobremesas com o Gelado Ó Balcão, um Celeste e um Arrepiado. Destes destaco o gelado pois os outros dois são doces tradicionais relativamente bem conhecidos. Este gelado conseguia uma ligação improvável entre o gelado de melão e a compota de pimento que resultava muito bem fazendo uso de sabores muito tradicionais.
Esta refeição foi acompanhada por vinhos da Adega do Cartaxo dos quais vou destacar dois deles. O Bridão Branco 2014 é um branco base da marca Bridão mostrou-se amarelo dourado pálido com aromas ligeiros a flores brancas acompanhado por um perfil cítrico. Boa acidez e uma ligeira untuosidade a dar-lhe alguma complexidade interessante na boca. Revela-se como um vinho interessante para a gama com uma muito boa relação qualidade preço. Noutro patamar mas também a mostrar um boa relação qualidade-preço está o Bridão Private Colection Tinto 2012 que se mostrou granada com laivos violeta revelando frutos vermelhos e ligeira terra molhada no nariz. Na boca revelou algum balsâmico que lhe emprestava frescura num conjunto muito bem conseguido. E que belo é aquele rótulo.
Olhando para a carta da Taberna Ò Balcão fica-se na dúvida de como é possível trabalhar com uma carta tão grande. Se nas secções Sopas, Peixe e Carnes os 14 pratos até parecem facilmente geríveis, quando olhamos para a secção de Petiscos juntamos mais 35 pratos que vão desde 3 variedades de queijo até ao ensopado de borrego. Cada vez que olhava para a lista encontrava mais alguma coisa a despertar-me a curiosidade. Obviamente que o cliente agradece esta disponibilidade mas talvez fizesse sentido reduzir um pouco a carta para facilitar o serviço na cozinha.
Mas se ainda tiverem reticencias acerca da valia da viagem para provar esta taberna pode experimentar o seu balcão em versão mar no recentemente renovado Mercado de Algés que tem agora uma zona de restauração à imagem do quem sido a tendência dos últimos anos em diversos mercados. Chama-se Peixe Ó Balcão e neste espaço é possível comer pratos de peixe e marisco, alguns vindo directamente da carta da Taberna Ó Balcão outros exclusivos do espaço no Mercado de Algés. Dos pratos que tive a oportunidade de provar por lá há alguns dias destacarei três. O surpreendente Cação Frito com Molho de Iogurte e Lima em que uma fritura perfeita e um polme com um pouco de cominhos nos apanhava desprevenidos deixando-nos na boca um sabor a fazer lembrar caril. O incontornável Arroz de Lingueirão onde a cremosidade era a palavra de ordem e os lingueirões estavam mais tenros do que é habitual neste molusco. E o já quase clássico Prego de Atum no Caco aqui com um bolo do caco feito segundo uma receita do próprio Rodrigo e um atum somente selado e a desfazer-se na boca. Aqui a carta fica-se pelos 17 pratos...
Mas se isso ainda não chegar na segunda metade de Setembro o Rodrigo Castelo cumprirá, em representação do Ribatejo, mais uma etapa do Portugal de Norte a Sul que sob a coordenação da Fátima Moura tem vindo a trazer ao Terraço do Tivoli Lisboa cozinhas de diferentes regiões de Portugal. Esta será mais uma boa oportunidade para conhecer a cozinha de Rodrigo Castelo.
O objectivo do Rodrigo é mais cedo ou mais tarde abrir portas em Lisboa. Embora perceba as razões do Rodrigo, confesso que me entristece que um jovem chef como ele sinta a necessidade de vir para Lisboa para conseguir o retorno que deseja ter do seu trabalho. É pena que pareça não existir espaço para cozinhas criativas com identidade nas nossas cidades menos centrais e estejamos condenados a este centralismo culinário. É certo que Lisboa já foi Capital do Império e que na mentes de cada vez mais é o Centro do Universo mas aqui estas cozinhas não passam de expatriados gastronómicos numa cidade que cada vez mais descarta novidades à velocidade da luz. Embora cozinhas como estas possam ter embaixadores fora dos seus territórios não deviam deixar de ter as suas sedes nas suas origens. Por isso gastem um par de horas na ida e volta de carro entre Lisboa e Santarém e vão lá experimentar a Taberna Ó Balcão. Pode ser que assim não venha a ser preciso ir a Lisboa para experimentar a nova cozinha ribatejana.
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