Ferreira Dona Antónia Alourado Adamado

Este Porto terá sido engarrafado no final da década de 60, início da década de 70 do século passado. Foi oferecida aos avós da Ana e estagiou durante alguns anos no seu armário de bebidas em Alferrarede, provavelmente em cascos de aparite ou de aglomerado (não, nessa altura não se usava MDF por estes lados). Não muitos anos depois rumou a Sul ao longo do Tejo para aportar no Barreiro juntamente com a família. Os anos passaram e ela continuou sossegada nesse armário enquanto cá fora se nascia, crescia, ria, comemorava e se chorava a morte. Ficou neste torpor durante cerca de quatro décadas até que um dia alguém decidiu que era tempo de a acordar para a pôr à prova.

No ano passado a avó da Ana decidiu oferecer-me esta garrafa. Fiquei muito honrado com esta demonstração de carinho. Obviamente uma garrafa como esta teria de ser objeto de partilha e foi aberta na noite do Natal passado para acompanhar os doces de Natal juntamente com a Ana, os pais da Ana, os meus pais e o meus padrinhos. Acabou por não se beber toda nessa noite e o que sobrou partilhámos com o Nuno, a Ema, o Jorge e a Ana num jantar de amigos.

Até o nome deste vinho é uma viagem no tempo. Alourado é uma denominação que caiu em desuso e que é o equivalente português à atual denominação Tawny. O Adamado que seria mais ou menos equivalente a Doce embora penso que não estivesse regulamentado o grau doçura necessário para apresentar esta denominação tal como está atualmente definido para se poder apresentar a denominação Doce. Esta denominação de Adamado também caiu em desuso para os Portos embora ainda seja por vezes usada em vinhos de mesa ou outros com um grau doçura maior. Assim "traduzido" para a atualidade o nome deste vinho seria Ferreira Dona Antónia Tawny Doce. Deverá corresponder em termos de gama ao atual Ferreira Dona Antónia Tawny Reserva que se vende no retalho por 10-12€. Encaixaria portanto na gama de Porto que atualmente se denomina de Reserva ou Reserve. Supostamente os Tawnies não envelhecem em garrafa mas vocês já sabem que eu tenho uma opinião muito própria acerca disto...

Com cor avelã escura e aromas de caramelo, notava-se algum álcool volátil que acabava por lhe dar alguma frescura. Com uma acidez contida, na boca, fazia lembrar aqueles rebuçados de café pequeninos. Um ligeiro fumo no final dava-lhe carácter e distinção. Violentamente bom, na boca e na memória. E não me lixem, este vinho não era assim quando foi engarrafado e este estágio em "aparite" fez-lhe bastante bem...