As conservas é um daqueles produtos tradicionais portugueses que tem vindo a ser redescoberto pelos portuguesas nos últimos anos. As primeiras conservas de peixe em lata que há memória em Portugal datam de 1855, tendo sido enviadas para a Exposição Mundial de Paris e ganho uma menção honrosa. Mas só em 1865 há registos da primeira instalação industrial de grandes dimensões dedicada às conservas em lata. Sempre foi um sector com uma elevada taxa de exportação tendo as duas guerras mundiais representado alturas de grande crescimento nas exportações.
Na Primeira Guerra Mundial este crescimento foi bastante desregulado tenho dado origem a muitas empresas que visavam o lucro rápido e fácil e que não resistiram ao decréscimo das exportações no pós-guerra deixando atrás de si um rasto de má fama devido à baixa qualidade e mesmo fraudes que algumas destas empresas praticavam. Os próprios governos deste período viram neste crescimento da industria uma fonte de receita e sobre-taxaram esta indústria reduzindo a sua competitividade.
Com o Estado Novo a industria foi reorganizada e a qualidade dos produtos foi sujeita a um controlo apertado não sendo permitida a exportação de produtos que não apresentassem níveis mínimos de qualidade. Isso melhorou bastante a imagem de qualidade das conservas portuguesas no estrangeiro. O facto de os produtos que não cumpriam os requisitos mínimos de qualidade ficarem em Portugal combinado com facto das conservas serem promovidas pelo regime como uma fonte de proteínas e gordura barata e facilmente acessível à populações do interior levou a que as conservas fossem vistas em Portugal como um produto das classes baixas e de menor qualidade.
Apesar de tudo as conservas de peixe desempenharam um papel bastante importante na alimentação das populações menos favorecidas do interior de Portugal. Além do bacalhau seria a maneira mais fácil de fazer chegar peixe de mar ao interior, eram relativamente baratas, não precisavam de cozedura adicional e vinham já com a gordura que podia ser usada para temperar o próprio prato ou com outros fins. Mas não se livraram do estigma de serem comida de pobre e com o 25 Abril e à medida que o poder de compra e as acessibilidades melhoravam foram sendo postas cada vez mais de lado.
Nos últimos anos têm-se assistido cada vez mais a um ressurgimento das conservas e do seu posicionamento como um produto nobre e de qualidade. Ainda não chegamos ao ponto de termos conservas envelhecidas e rotuladas com o ano de captura como é feito por alguns produtores espanhóis mas muito mudou na indústria e nos consumidores de conservas em Portugal nos últimos anos. Apesar de isso continuar a não ser muito visível para os portugueses, as conservas continuam a desempenhar um papel muito importante na economia portuguesa sendo um dos produtos agro-alimentares mais exportado por Portugal.
A família Nero, de origem italiana, instalou-se em Sesimbra em 1680 com o objectivo de produzir peixe salgado e peixe seco. Em 1912 a actividade da família estava concentrada exclusivamente na conservação do peixe pelo sal e Amadeu Henrique Nero juntamente com outros sócios abriu uma fábrica de conservas dando origem à Paschoal, Nero & Cª. Passados alguns anos os sócios foram saindo e Amadeu Henrique Nero tornou-se o único proprietário da empresa que viria a chamar Nero & Cª. Em 1926 Amadeu Henrique Nero acaba com o negócio da conservação do peixe pelo sal e concentra-se exclusivamente nas conservas em lata. As conservas Nero atravessam assim quase todo o século XX tendo em 1944 mudado a sua sede e fábrica para Matosinhos.
Em 1989 já sob a liderança dos netos de Amadeu Henrique Nero, Filipe Nero e José Nero, a família Nero acaba por vender a fábrica de Matosinhos. Passado pouco tempo, José Nero abre uma pequena unidade de produção de anchovas no Montijo que iniciou a sua produção em 1992 mas que devido a uma conjuntura muito complicada encerrou passados poucos anos em 1996. Em 2010, José Nero retorna ao negócio da família com a Conservas Nero recuperando algumas das marcas históricas da Nero como a Catraio, a Georgette e a Naval subcontratando a sua produção a outras fábricas portuguesas. Esta nova etapa da Nero é caracterizada também pela inovação com o lançamento de conservas novas e únicas tendo sido a primeira dessas conservas a Filetes de Peixe Espada Preto em azeite. Foi no âmbito de uma acção de teste e prova de novos produtos que poderão vir a integrar o portfólio da marca que recebi há uns meses atrás quatro conservas de atum da Nero que vim a provar ao longo destes meses.
O Filete de Atum com Chícharos e a Salicórnia foi a primeira que provei, até pela curiosidade que tinha em perceber como estes ingredientes menos conhecidos funcionariam numa conserva. Estava à espera que os sabores dos chícharos e em especial a salicórnia sobressaíssem mais, mas isso acabou por não acontecer embora todos os sabores estivessem integrados num conjunto harmonioso. Têm lá tudo e pode funcionar como um prato completo não precisando de acompanhamento. Devendo ser único o uso de chicharros em conserva pode ter um bom mercado entre os saudosistas desta leguminosa.
A conserva em relação ao qual estaria mais desconfiado seria o Filete de Atum com Tomate Seco. Mas o que é certo é que o sabor forte do tomate seco integrava-se muito bem no filete ganhando este um toque agridoce e um ligeiro fumado. Uma ligação muito bem conseguida. Provavelmente a melhor ligação apesar de não parecer a mais provável à partida.
Tinha expectativa acerca dos Filetes de Atum com Algas. De início desapontaram-me um pouco pouco em termos de sabor as algas praticamente não se notam mas depois percebi que a sua humidade passa para o atum tornando o filete um pouco menos seco do que é habitual neste tipo de atum. A algas acabam por beneficiar de um modo muito interessante o conjunto embora para muitos possa passar despercebida a sua ação.
Nos Filetes de Atum em Azeite Biológico nota-se bem o cuidado na selecção do azeite, que se mostra claramente superior ao que é mais habitual nas conservas em azeite. Não me parece que isto se deva exclusivamente ao facto de este ser biológico mas é inegável a sua qualidade.
As conservas fazem parte da minha vida. Tenho a despensa cheia, sardinhas, petingas, cavala, atum, ventresca... Todas em azeite, já há uns anos que o óleo deixou de entrar cá em casa, seja em lata ou em garrafa. Um dos meus pratos de conforto é Atum com Feijão Frade, bem entretanto já fiz o upgrade e passou a ser Ventresca com Feijão Frade...
Importo Conservas Nero e devo dizer que os meus clientes estao encantados com o produto.
ResponderEliminar