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Las Lanzas

A Lancers é uma daquelas marcas que os enófilos costumam desvalorizar com muita frequência. Ai e tal, é rosé, não é coisa de homem, é refresco, é docinho. Mas o que é certo é que esta marca é das mais importantes no portfólio da José Maria da Fonseca devido a ser uma das marcas mais exportadas e com maior reconhecimento internacional da empresa. Foi criada numa altura em que a José Maria da Fonseca atravessava um período complicado em que depois de uma fase de crescimento suportada fundamentalmente pelo mercado brasileiro, sofreu o impacto da recessão mundial e da instabilidade politica no Brasil. A crise financeira foi um dos catalisadores para a revolução de 1930 no Brasil que levou Getúlio Vargas à presidência tendo este fechado as fronteiras brasileiras às importações para proteger a economia interna. Nessa altura foi necessário vender património e a recuperação só acabou por ser assegurada pela aposta nos Rosés.

Las Lanzas - reservarecomendada.blogspot.pt

Para sair desta crise a José Maria da Fonseca, pela mão de António Porto Soares Franco, apostou na produção de vinhos sem estágio e de consumo rápido que pudessem ter retorno financeiro rápido ao invés da prática de estágios longos habitual no sector. No âmbito desta estratégia surgiu o Faísca que terá sido o primeiro rosé português. Lançado em 1937 na inauguração da Feira Popular, na altura onde é hoje a Gulbenkian, o Faisca tornou-se um sucesso imediato. Alguns anos mais tarde, Henry Behar andava à procura de um vinho fácil de beber capaz de agradar ao público americano menos conhecedor de vinho e encontrou no Faísca um boa base para isso. Tendo o Faisca como base criou-se o Lancers mais doce e com gás. A marca Lancers era originalmente propriedade de Henry Behar que se inspirou no quadro de Velasquez, A Rendição de Breda (também conhecido por Las Lanzas) para cunhar a marca Lancers.

O Lancers chegou a ser o vinho importado mais vendido no Estados Unidos, no final da década de 60, com 12 milhões de garrafas anuais. Foi também devido ao Lancers que foi instalada em Portugal a única unidade de gaseificação e espumantização natural a operar segundo o método continuo também chamado de método russo. O método continuo é uma variação do método de Charmat em que são usadas um conjunto de cubas pressurizadas (normalmente 5) interligadas sendo o vinho base e as leveduras adicionadas na primeira cuba onde começa a fermentação secundaria que continua na segunda e terceira cuba. A segunda e terceira cuba tem aparas de carvalho ou uns anéis especiais onde se agregam a leveduras mortas e facilitam a posterior filtração e clarificação. Na quarta e quinta cuba o vinho é filtrado e clarificado podendo ser imediatamente engarrafado sob pressão ou transferido para uma sexta cuba onde será efectuado o engarrafamento. É um processo continuo em que o vinho leva entre três semanas a um mês entre a entrada na primeira cuba e o engarrafamento. O contacto com as leveduras é curto pelo que os vinhos e espumantes dai resultantes não são muito complexos mas são frescos e fáceis de beber conseguindo-se um bom equilíbrio entre a qualidade e o volume da produção.

Entretanto Henry Behar vendeu a marca Lancers e a parceria com a José Maria da Fonseca à Heublein em meados da década de 60. Com o 25 de Abril a José Maria da Fonseca voltou a sofrer com a instabilidade politica, desta vez, dentro de portas e em meados da década de oitenta foi necessário realizar vendas para continuar com saúde financeira e foi a parceria com a Heublein, a Lancers e a respectiva unidade de produção que foi sacrificada. Esta venda permitiu à José Maria da Fonseca desafogo financeiro, a modernização das adegas e aquisição de vinhas como a Casa Agrícola José de Sousa Rosado Fernandes. Onze anos depois o grupo britânico IDV, que entretanto tinha comprado a Heublein, quis concentrar a sua atividade na distribuição tendo decidido vender todas as unidades de produção que tinha e vendeu à José Maria da Fonseca a marca Lancers e a unidade de produção que regressou assim ao seio da José Maria da Fonseca. O Lancers já não tem o peso que chegou a ter nas contas da José Maria da Fonseca mas continua intimamente ligada à sua história, sem o Lancers a José Maria da Fonseca não seria o que é hoje e podia até ter-se perdido no tempo...


Bem, isto era para ser mais curto mas perdi-me na história... Vamos lá ao que nos trouxe aqui, os espumantes Lancers. O Lancers Branco Bruto foi lançado originalmente para o mercado em 1984, pouco antes da Heublein adquirir a totalidade da Lancers. Passados 30 anos continua a ser produzido usando a unidade de método continuo da Lancers. Mostra-se amarelo claro com bolha média. Aromas ligeiros de flores brancas com algum mineral. Boa acidez, ligeira tosta, ligeiro vegetal e algum cítrico. Pouco exuberante mas bem feito para agradar a um público alargado.


Já o Lancers Rosé Bruto é uma estreia e foi feito pelo método de Charmat certamente porque a quantidade produzida é menor e talvez por isso parece estar um pouco mais cuidado. Com cor salmão claro e bolha média, mostra aromas florais ligeiros com alguma líchia. Acidez, ligeira tosta, ligeiro mas bem conseguido a cumprir o que se esperaria dele... Um espumante simples e sem pretensões mas que ainda assim dá bastante prazer

Os vinhos provados foram gentilmente oferecidos pelo produtor.

Bibliografia:
João Barbosa, Grande Reserva, Oficina do Livro
Ceferino Carreira, Sua Excelência O Champanhe e Os Nobres Espumantes Naturais Portugueses, Colares Editora
José Maria da Fonseca

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