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Entre a Rolha e a Cortiça* – Parte II: A Cortiça?

Ler a Primeira Parte


A cortiça sempre teve a primazia como vedante usado para o vinho mas tornou-se também um sinónimo de um dos defeitos do vinho mais comuns. Um vinho com rolha é um vinho com um aroma que pode ser descrito como um aroma a mofo ou a bolor que tem origem em várias substâncias sendo a mais habitual e conhecida o 2,4,6-Tricloroanisol (TCA). A rolha de cortiça não é a única culpada desta contaminação podendo ter origem nas barricas ou em outras contaminações durante o processo produtivo. Há casos de contaminação sistémica que podem afetar toda uma adega, mas geralmente a rolha é considerada a culpada deste defeito. Atualmente a indústria corticeira tem investido em processos de deteção e de remoção de TCA´s da cortiça e a taxa de contaminação devido a rolhas de cortiça desceu bastante mas este estigma continua a pairar sobre a cortiça.

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Aquilo que é uma das grandes vantagens da cortiça é também uma das suas falhas. A cortiça permite trocas gasosas com o exterior o que fará que os vinhos sejam lentamente oxigenados e oxidados com o tempo. O envelhecimento do vinho é entre outras coisas um processo de oxidação do vinho. A velocidade e a qualidade deste processo também depende do vinho e da sua capacidade de evolução mas a rolha tem um papel determinante e chegará um dia em que esta evolução passará o seu apogeu e o vinho começará a decair inexoravelmente. Como se fosse um ser vivo, um vinho rolhado com cortiça viverá, evoluirá, mas morrerá inevitavelmente. Em vinhos mais resistentes como os generosos a preocupação fundamental é que rolhas não cedam ou apodreçam por velhice e algumas casas de vinho do Porto fazem uma verificação do estado das rolhas dos seus vintages procedendo à sua troca a cada 20 ou 30 anos.


Por outro lado a cortiça sendo um produto natural e vivo é um produto imperfeito. Assim apesar da existência de controlos de qualidade e da classificação das rolhas em diversos níveis de qualidade é impossível garantir que todas rolhas são completamente homogéneas. O mesmo vinho em diferentes garrafas com rolhas diferentes poderá assim estar morto ao fim de uns anos ou viver durante décadas. Isto gera frustração entre produtores e enófilos tornando imprevisível a evolução do vinho ao longo do tempo.


Sempre existiram soluções alternativas para a vedação do vinho. A motivação para algumas destas soluções era e é o custo sendo possível ainda encontrar no mercado em gamas de vinho corrente de muito baixo custo umas pequenas tampas plásticas seladas por capsulas metálicas. Menos habituais mas também usadas são as capsulas semelhantes às usadas nas garrafas de cerveja. Mas os problemas gerados pela rolha de cortiças combinados com o seu custo levaram a indústria a tentar encontrar formas alternativas para a vedação do vinho que pudessem não ser usadas apenas nos vinhos de gama baixa mas de uma forma mais generalizada. As duas principais soluções no mercado são a capsula roscada (screwcap) e as rolhas sintéticas.


As capsulas roscadas apresentam a vantagem de não necessitarem de saca-rolhas para a abertura da garrafa. São praticamente estanques deixando o vinho praticamente parado no tempo com o que isso tem de bom e de mau. O vinho estará passados anos praticamente igual ao dia em que foi engarrafado não existindo qualquer estágio/envelhecimento em garrafa. Pode assim fazer sentido para vinhos que estão prontos a beber na altura do engarrafamento e onde se pretende preservar essas suas características. Não é adequado para vinhos em que se pretenda que evoluam em garrafa. A estanquidade que proporcionam tem um senão que é a possibilidade de aparecimento de aromas de redução devidos a esta ausência de oxigenação.


As rolhas sintéticas têm o formato de uma rolha de cortiça e algumas tentam mesmo replicar o seu aspeto mas são feitas de materiais plásticos. Os estudos realizados parecem mostrar que este tipo de rolhas permitem mais trocas gasosas com o exterior que as rolhas de cortiça sendo mais rápida a oxidação do vinho. Tem a grande vantagem de não partirem e terem um comportamento mais consistente e previsível, durante um período mais longo. Este tipo de rolha pode ser um sério concorrente à rolha de cortiça caso consigam atingir um desempenho mais próximo das rolhas de cortiça no diz respeito a trocas gasosas com o exterior pois em termos de consistência e longevidade o seu desempenho é bastante bom.


Mas no fim de contas qual será a solução ótima para a vedação de vinhos? Como sempre não há uma solução ótima e a opção depende muito do vinho e dos objetivos do produtor. Assim vinhos que estejam prontos a beber e cuja evolução não seja desejável beneficiam do uso da capsula roscadas. As rolhas aglomeradas ou técnicas também podem ser uma boa solução para estes casos pois também têm um grau de estanquidade elevado, perdem no entanto em longevidade e são também menos práticas devido a requererem um saca-rolhas. Em vinhos de rotação rápida mas que possam beneficiar de alguma oxigenação as rolhas de cortiça natural e as rolhas sintéticas parecem ser a melhor opção. Para vinhos de guarda em que se pretenda evolução em garrafa a cortiça natural parece ser a única solução com a exceção talvez dos generosos para os quais a oxidação não seja um problema e que não seriam prejudicados pela utilização de rolhas sintéticas.


Será que o consumidor deve fazer depender a escolha dos seus vinhos do vedante usado? Bem, sim e não. Não, porque o vedante só por si não torna o vinho melhor ou pior e não há um único vedante que seja completamente adequado a todos os vinhos. Sim, porque dependendo do tipo de vinho haverá vedantes mais e menos adequados e o vedante usado pode dar-nos dicas acerca do vinho que temos na garrafa. Não faz sentido esperar que um vinho com 10 anos que use cortiça natural esteja tal qual quando foi engarrafado. Assim como não faz sentido esperar evolução em garrafa se com o mesmo vinho se usar capsula roscada. Dificilmente compraria um garrafeira com capsula roscada pois o seu uso num vinho que seria suposto evoluir em garrafa é uma contradição. Mas provavelmente até compraria um branco com 10 anos que usasse capsula roscada nem que fosse pela curiosidade de perceber se este estaria com as mesmas características de quando foi engarrafado.


Em certos segmentos a cortiça dificilmente conseguirá competir com a capsula roscada. E se as rolhas sintéticas conseguirem resolver alguns dos seus problemas poderão causar alguma ameaça à cortiça. Atualmente a comunicação da indústria da cortiça tem-se baseado fundamentalmente no fator emocional, na sustentabilidade e na sua importância ambiental. Tenho dúvidas acerca que esta seja a melhor estratégia pois não ataca os principais argumentos dos seus concorrentes: o defeito de rolha e a evolução do vinho em garrafa. Penso que deveria ser realçada a grande evolução na deteção e eliminação do TCA e em geral no controlo de qualidade das rolhas. Deveria ser também realçado que as características da cortiça são as mais adequadas à desejável evolução do vinho em garrafa não parecendo existir substituto à altura. Em conclusão, a cortiça não parece ter o seu lugar ameaçado como principal vedante de vinhos mas a industria terá de continuar a investir no controlo de qualidade de modo a eliminar o estigma do defeito de rolha e a conseguir um desempenho mais consistente dentro de cada gama.

* Por lapso meu, o título original deste artigo era igual ao título do livro "To Cork or Not to Cork" de George M. Taber que também versa sobre a utilização da cortiça e de outros vedantes para o vinho. O uso desta expressão não foi intencional e apesar de já me ter cruzado com outros livros de George M. Taber não conhecia este livro tendo sido uma coincidência ter usado o mesmo título para os meus artigos. Para que não fiquem dúvidas das minhas intenções alterei o título do meus artigos de maneira a evitar que exista alguma confusão entre os meus modestos artigos e o trabalho de George M. Taber.

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